21/07/2008

Cinemania (2002)

Cinemania foi apresentado no Festival do Rio 2002 – no meio de uma maratona de filmes, um filme que documenta figuras estranhas que assistem sempre a vários filmes por dia. Pois então, por mais estranho que possa parecer ao longo da sessão, o contexto adequado para Cinemania sem dúvida é um festival de cinema, justamente porque ali seus espectadores encontrarão razões para se identificar com as figuras documentadas. Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer o bom humor dos programadores, até porque este é o tipo de filme que pode desestimular os espectadores do filme de fazerem novas incursões no festival. Afinal, o filme parece crer que a cinefilia cobra um alto preço dos seus fiéis – dificuldades nas relações cotidianas (como acontece com Roberta), nas questões amorosas e sexuais e nos problemas financeiros. Todos estes são problemas comuns a muita gente em diversos períodos – mas pelo título o filme já denuncia sua intenção, a de investigar a cinefilia em nível possivelmente patológico como causa e/ou conseqüência de todas estas dificuldades.

Bem, daí temos o seguinte: estamos de fato compreendendo (e nos reconhecendo) nas pessoas documentadas? Ou será que estamos apenas morrendo de rir ou de pena ‘daquelas figuras esquisitas’? Se for assim (e, infelizmente, é esse o caminho que o filme segue), então Cinemania é um filme contra a cinefilia. Legal. Para quê? A melhor hipótese é que seja para tirar público do Festival do Rio – onde pode provocar reflexões necessárias em alguns que se identifiquem um pouco com os problemas das pessoas retratadas e que, no dia seguinte a um filme desses, podem aproveitar o tempo livre para passear, meditar um pouco ou ir dançar ao som de uma boa música.

Porque em circunstância diversa teremos um filme que não demonstra qualquer interesse por idéias minimamente consistentes dos seus personagens acerca dos assuntos que realmente lhes interessam – à exceção de uma apologia da opção pela vivência dos filmes em detrimento da realidade que acontece fora das salas de cinema, num depoimento que parece ser escolhido por ilustrar a tese do filme de forma pouco sutil – até grotesca.

Como que numa tentativa de justificar ou tentar validar seus retratos, o filme termina com a obviedade de nos mostrar seus personagens se vendo documentados na tela – e um deles sugere que o filme seja mais longo, numa bela egotrip. Mesmo que nos pareçam cruéis, os retratos são reconhecidos como fiéis pelos retratados – e daí que o são? Isso não acrescenta muita coisa, infelizmente.

Vale lembrar, de todo modo, que são bastante divertidos os curtos momentos em que a platéia pode eventualmente se identificar com as manias dos personagens – como nos comentários sobre projeções fora de foco ou consumo de pipoca durante os filme – o que é mais um indício de que é bem restrito o público a que o filme parece se destinar, na melhor das hipóteses. Pode funcionar como filme-advertência num festival-evento de cinema internacional. Fora dessas circunstâncias, o filme é apenas cruel, nada além disso – e não parece alcançar qualquer outro propósito.

Texto publicado originalmente em outubro de 2002