23/07/2009

Hélio Silva e sua luz

O início da carreira de Hélio Silva de certo modo representa um ponto de transição entre os grandes fotógrafos que marcaram a produção de cinema brasileira anterior aos anos 50 e os que surgiriam nos anos seguintes. Nascido em Minas Gerais, logo nos primeiros anos em que se meteu a mexer com cinema Hélio teve a oportunidade de trabalhar com os maiores diretores de fotografia daquele momento, início da década de 50. Foi assistente ou operador de câmera de profissionais como Mário Pagés em Agulha no Palheiro, Ruy Santos em Uma Vida Para Dois, Balança Mas Não Cai, O Craque e A Sogra e Edgar Brazil, o célebre fotógrafo de Limite, em Mulher de Verdade – filme dirigido por Alberto Cavalcanti, figura que impressionou o jovem Hélio por seu vasto conhecimento técnico de cinema.

Essa admiração pelo saber de Cavalcanti – que, segundo Hélio costumava lembrar décadas depois, era capaz de orientar com perfeição e rigoroso domínio técnico seus diferentes colaboradores no set de filmagens - permite que se note uma das principais características do profissional Hélio Silva: seu domínio do saber técnico da produção de filmes, seu amplo conhecimento sobre os diversos aspectos que a compõem. Hélio Silva teve a oportunidade de aprender com os mestres da sua época como dominar os diferentes fatores determinantes do registro de imagens em película, aprendendo sobre emulsões e tempos de revelação (nestas questões, podemos imaginar, ele teria facilidade de aprendizado também por já ter cursado por curto período uma Faculdade de Química), lentes e filtros.

Esse domínio da técnica fotográfica se somou a outra característica do trabalho de Hélio: a organização visual que transmite a impressão de relação imediata com a realidade. E estas duas características foram determinantes para definir o percurso de Hélio Silva como profissional de cinema. Como se sabe, depois de trabalhar para as empresas de São Paulo Multifilmes e Kinofilmes, Hélio Silva conheceu Nelson Pereira dos Santos quando ambos eram assistentes de Agulha no Palheiro, o filme de Alex Viany com fotografia de Mário Pagés, e Nelson convidou-o para assinar a fotografia de Rio Quarenta Graus, seu filme de estreia que hoje é considerado um marco da produção de cinema no Brasil. Nelson conta que a proximidade entre eles se originava na relação entre as funções (um era assistente de direção, o outro era assistente de câmera) e na proximidade das opiniões políticas. Mas Hélio lembrava ainda de um fator significativo: segundo ele, eventualmente Alex Viany cometia erros técnicos de direção, por conta de seu desconhecimento – erros como quebrar o eixo visual ao passar de um plano a outro, algo que impede que fique claro para o espectador qual é a geografia da cena e para onde olha cada personagem. Segundo essa lembrança que Hélio registrou na entrevista para Carlos Ebert, foi o domínio da técnica que aproximou os dois assistentes.

Nelson Pereira teve como fonte de inspiração, como se sabe, os filmes do neo-realismo italiano para imaginar Rio Quarenta Graus (além de Capitães de Areia, de Jorge Amado). Era natural que procurasse com seu fotógrafo um registro de imagem que tivesse a mesma atmosfera de não-mediação, e assim o estilo visual de Rio Quarenta Graus, tanto quanto sua narrativa, indicou o surgimento de uma nova perspectiva estética para o cinema feito no Brasil.

Mas a produção do filme, como se sabe, não foi moleza. Segundo contou a Ebert, Hélio relutou em assumir o compromisso de fazer o filme, uma vez que isso implicaria em abrir mão de seu trabalho como assistente de câmera da Multifilmes em São Paulo. Nelson não tinha grandes recursos para o filme – na verdade, seus planos eram de fazê-lo através de um regime de cotas em que os profissionais receberiam seu pagamento a partir do lucro do lançamento no circuito de salas de cinema. Os relatos sobre as dificuldades financeiras têm sempre algo de pitoresco – todos tinham que morar juntos, a alimentação era à base de macarrão etc -, mas indicam claramente a precariedade das condições, que se estendia à parte técnica e logística do filme. A câmera foi obtida com Humberto Mauro no INCE (Instituto Nacional de Cinema Educativo) e precisou passar por um longo processo de reparo nas mãos de Hélio. Não havia quase nenhum equipamento de iluminação, somente nas poucas cenas feitas em estúdio. Alguns dos fotógrafos da geração anterior, como Rui Santos, costumavam usar filtros específicos para dar volume ao contraste do filme em preto e branco, criando assim imagens de céu com nuvens fortemente destacadas, a partir de uma reconhecida influência dos trabalhos do mexicano Gabriel Figueroa. Pois em Rio Quarenta Graus Hélio fez diferente, usando filtros que suavizavam as relações de contraste, permitindo assim que a imagem ganhasse um tom semelhante ao usado em filmes documentais – e permitindo também que a luz de quase todo o filme (com exceção de poucas cenas) fosse feita tendo como fonte somente o sol, sendo equilibrada com o uso de alguns rebatedores.

A história da polêmica de Rio Quarenta Graus é bem conhecida: o Delegado-Geral da cidade do Rio de Janeiro, Menezes Cortes, interditou o filme por considerar que ele era ofensivo à imagem da cidade. Isso gerou uma repercussão que provocou a solidariedade de muitos intelectuais célebres e ajudou um bocado na divulgação do filme – que, enquanto estava proibido no Rio de Janeiro, obteve boa bilheteria em São Paulo e, posteriormente, também fez boa carreira na então capital do país.

A partir da notoriedade de seu filme de estreia, Hélio Silva se tornou por alguns anos o principal nome da fotografia para cinema no Brasil e estabeleceu algumas das principais parcerias que manteria ao longo de sua trajetória profissional. Nos doze anos seguintes a Rio Quarenta Graus, Hélio Silva fez em seguida com Nelson Pereira a obra-prima Rio Zona Norte e o filme inventado às pressas Mandacaru Vermelho; com Roberto Santos, fez O Grande Momento, A Hora e a Vez de Augusto Matraga e O Homem Nu; com Roberto Pires, fez Redenção, A Grande Feira e Tocaia no Asfalto. Estes trabalhos derivaram diretamente da boa repercussão do trabalho em Rio Quarenta Graus. Com o sucesso de seu primeiro filme, Nelson Pereira apostou os recursos em duas novas produções: o seu Rio Zona Norte e o filme de estreia de seu parceiro Roberto Santos, O Grande Momento. Para fazer Rio Zona Norte, Nelson contou com dois outros colaboradores fundamentais, além de Hélio Silva: um deles foi o cantor e compositor Zé Kéti – de quem Nelson tornou-se tão próximo que chegou a afirmar mais de uma vez que Rio Zona Norte foi pensado como uma homenagem ao amigo e inspirador; e o outro foi o ator Grande Otelo, que interpreta o protagonista Espírito da Luz – Otelo, que já havia feito dezenas de filmes, era célebre como astro de chanchadas e do teatro de revista, teve neste filme um desempenho impressionante. Em Rio Zona Norte Hélio Silva pôde fazer um trabalho com experiências mais fortes de intensidade dramática – neste caso, havia enredo e havia produção para isso. É o que acontece nas imagens das cenas mais violentas do filme - as da perseguição e morte de Lourival, o filho de Espírito -, que têm uma luz mais intensa e um contraste acentuado, num retrato quase agressivo do ambiente de vielas da favela. Do mesmo modo, o ambiente da casa do músico Moacir tem uma luz cujo equilíbrio indica explicitamente que ela faz parte de outro universo cultural.

Também foi graças à notoriedade conquistada com o primeiro filme que Hélio recebeu o convite de Roberto Pires para fotografar o filme de estreia do realizador baiano, Redenção – não apenas de Pires: na verdade, o filme viria a ser o primeiro longa realizado na Bahia. Pires era outro sujeito com interesse e facilidade de dominar os aspectos técnicos – e logo no seu primeiro filme teve a ideia arrojada de criar uma lente que lhe possibilitasse registrar as imagens em visão panorâmica, como os filmes norte-americanos já haviam feito com o seu CinemaScope. Pois então Pires desenvolveu um modelo de lente para câmera filmadora (e posteriormente adaptável para projetores de filmes) que fazia o mesmo processo de compressão/descompressão com a imagem filmada e batizou-o com o nome de IgluScope, a partir do nome de sua empresa produtora, a Iglu Filmes. Era uma atitude temerária assinar a fotografia de um filme registrado com uma lente que estava sendo usada pela primeira vez, em caráter experimental – e Hélio topou.

Redenção é uma curiosa história sobre culpa que se passa em uma praia e uma casa do litoral baiano, realizada com recursos tão ou mais limitados que os de Rio Quarenta Graus. Pires segue um modelo de cinema de gênero, com a construção de momentos de tensão e clímax, apostando no artesanato e na força do conflito dramático. No entanto, o filme chegou a pagar pelo seu experimentalismo tecnológico: ao ter sua primeira cópia examinada pela censura, Redenção foi interditado por alegada “deficiência técnica” – porque o censor assistiu à cópia sem usar as lentes adequadas no projetor, e viu então as imagens comprimidas e distorcidas pela filmagem com a lente Igluscope. Posteriormente, quando o filme foi liberado após os devidos esclarecimentos, a inovação mostrou-se uma armadilha para seus produtores: por conta dela, o filme só poderia ser exibidos nas salas que tivessem a lente adaptada da IgluScope. Por conta disso, em Salvador, cidade de origem dos realizadores, o filme só pôde estrear e permanecer em cartaz numa única sala, a do Cine Guarany.

Em seguida, chamado por Nelson Pereira, Hélio criou as imagens de O Grande Momento, primeiro filme de Roberto Santos. Neste caso, ao retratar os bairros de gente de baixa renda da São Paulo dos anos 50, especificamente os ocupados pelas famílias de imigrantes italianos, o filme apresentou uma visualidade que, mais do que nunca, aproximou-se da atmosfera das comédias de costumes italianas, com direito ao emocionante passeio final de bicicleta de Zeca, o protagonista interpretado por Gianfrancesco Guarnieri.

O investimento em Rio Zona Norte e O Grande Momento não reverteu nos lucros esperados para Nelson Pereira, que assim arquivou (definitivamente) o projeto do filme Rio Zona Sul. Durante estes anos e os seguintes, conforme conta Nelson em entrevista, ele e Hélio mantiveram a parceria de trabalho em alguns curtas-metragens documentais, contratados ora por Jean Manzon, ora por Isaac Rozemberg, dois produtores que ao longo dos anos 1950 e 1960 se especializaram em realizar pequenos filmes que serviam como complementos às sessões de cinema da época.

Dois anos depois de Rio Zona Norte Nelson estava de volta à produção de um filme de ficção, tendo então debaixo do braço o projeto da adaptação de um romance de Graciliano Ramos: Vidas Secas. Novamente convidou Hélio para assinar a fotografia da produção e, após reunir recursos para fazer o filme, foram-se eles e equipe para o Nordeste. Lá foram surpreendidos pela chuva: o local onde iriam filmar Vidas Secas já não estava mais seco, estava úmido e com vegetação abundante. Comprometido a rodar seu filme, Nelson improvisou um novo roteiro a que chamou de Mandacaru Vermelho, uma espécie de far-nordeste que ele próprio, Nelson, tratou de protagonizar. O projeto de Vidas Secas foi adiado por alguns anos e Nelson teve prejuízo considerável com o resultado final. Mas é bastante interessante observar como a fotografia de Mandacaru Vermelho difere tanto daquela que foi feita posteriormente por Luiz Carlos Barreto e José Rosa para Vidas Secas em 1965 (quando enfim Nelson realizou seu projeto) quanto do estilo de fotografia mais tradicional que se pode ver, por exemplo, num filme como Seara Vermelha (de Alberto D’Aversa, fotografado por Guglielmo Lombardi), também ambientado no sertão. Enquanto esse último procurou equilibrar os contrastes através do uso de luz pesada em cima dos atores para contrabalançar a forte luz do sol, o trabalho de Barreto e Rosa, como se sabe, buscou acentuar este contraste, marcando a luz pelo seu nível à sombra. O trabalho de Hélio Silva não segue nenhuma das duas opções – com o uso de recursos ínfimos (basicamente rebatedores) e eventualmente improvisando difusores de luz para conter o sol (conforme contou a Carlos Ebert, Hélio chegou a estender plásticos sobre os atores em alguns planos próximos). O resultado é uma luz que não é agressiva como a criada pela dupla Barreto/Rosa e não tem o peso (e o custo) da forma tradicional.

Com seu saber técnico, Hélio já estava se caracterizando então pela simplicidade que se tornou traço fundamental de sua carreira – e, de certo modo, uma armadilha, bem típica do contexto precário da produção de cinema no Brasil. Porque o caso é que interessa a diretores e produtores que o fotógrafo (como o técnico de som ou o cenógrafo) use sua técnica para alcançar um resultado ótimo no mais curto espaço de tempo possível. Pois Hélio Silva, com o seu saber, tornou-se capaz de obter excelentes resultados com recursos mínimos e em tempo exíguo. Desta forma, em vários momentos viu-se levado a ter como espaço de trabalho sobretudo os filmes de orçamento mais baixo e condições de trabalho mais limitadas. A geração que se seguiu a ele teve a capacidade (a sorte, talvez) de poder exigir melhores condições de trabalho – a tal ponto que já há décadas existe uma estrutura modelar básica para equipe de câmera e equipamento de luz que é muitíssimo mais custosa do que os esquemas em que Hélio acostumou-se a trabalhar.

Nos anos seguintes Hélio trabalhou em filmes produzidos na Colômbia (Tres cuentos colombianos e El Río de las Tumbas, ambos dirigidos por Julio Luzardo, o primeiro em parceria com Alberto Mejía Estrada). Fez em seguida um filme dirigido por Aurélio Teixeira – realizador que assinou alguns sucessos de bilheteria e que também se tornaria parceiro de Hélio em outras produções (como Meu Pé de Laranja-Lima, em 1970). Quando ele retornou ao Brasil, a produção de cinema entrava numa linha ascendente em termos de quantidade e de considerável ressonância na sociedade (ainda que restrita sobretudo aos filmes do grupo chamado de Cinema Novo). Hélio assinou então um dos seus trabalhos mais celebrados com a fotografia de um novo filme de Roberto Santos, A Hora e a Vez de Augusto Matraga. Filmada em Diamantina, essa adaptação de um conto de Guimarães Rosa (protagonizada por Leonardo Villar e Joffre Soares, produzida por Santos e por Luiz Carlos Barreto) foi outra cuja realização teve pouquíssimos recursos – mas tornou-se marcante pelo resultado obtido na soma desses diversos talentos. Com Roberto Santos, Hélio ainda faria outros três filmes: O Homem Nu (1968), uma impressionante alegoria sobre o clima opressivo que se instaurava naquele momento; Um Anjo Mau (1971) e Vozes do Medo (1972).

Nos anos seguintes, com a intensa produção de filmes do período do final dos anos 1960 e do surgimento da Embrafilme em meados dos anos 1970, Hélio estabeleceu novas parcerias que se tornariam frequentes. Com o produtor e diretor Jece Valadão, que conhecia desde Rio Quarenta Graus, Hélio faria O Matador Profissional (1969), Vale do Canaã (1971), Eu Matei Lúcio Flávio (1979) e O Torturador (1971) – estes dois últimos dirigidos por Antonio Calmon. Com o diretor e produtor Braz Chediak, Hélio fez Navalha na Carne (1969), Dois Perdidos numa Noite Suja (1971), Banana Mecânica (1974), Eu dou o que ela gosta (1975), O Grande Desbum... (1978),Perdoa-me por me Traíres (1980), Bonitinha mas Ordinária ou Otto Lara Resende (1981) e Álbum de Família (1981) – filmes de qualidade variável (em que o primeiro desta parceria, Navalha na Carne, é certamente o ponto alto), que mantinham um certo toque de classe em alguns dos textos escolhidos (os que eram originários do teatro de Plínio Marcos e, depois, de Nelson Rodrigues), no elenco estelar (Glauce Rocha, Lucélia Santos, Rubens Correa, Vera Fischer) e, é claro, no apuro visual que Hélio Silva obtinha com simplicidade. Finalmente, a última das parcerias que Hélio estabeleceu no final dos anos 60 e manteve ao longo da década seguinte foi com o produtor e diretor Pedro Carlos Rovai, com quem fez Adultério à Brasileira, Os Mansos, Crueldade Mortal (dirigido por Luiz Paulino dos Santos) e Amante Latino, a versão cinematográfica para o astro pop-cigano Sydney Magal. Hélio também fotografaria para Luiz Carlos Barreto o documentário Isto é Pelé (1974), sobre o grande jogador de futebol. Como se disse, não é à toa que ele se tornou parceiro de tantos produtores célebres – Hélio era capaz de combinar qualidade visual e rapidez como poucos poderiam fazer.

Com Nelson Pereira dos Santos, seu primeiro parceiro no cinema, Hélio ainda faria nos anos 60 a comédia de costumes El Justicero, uma divertidíssima sátira da juventude burguesa ipanemense protagonizada por Arduíno Colasanti (cuja matriz original, infelizmente, foi destruída pela censura – só sobreviveram cópias feitas a partir de um contratipo). Depois de alguns anos, a dupla voltaria a trabalhar em conjunto em meados dos anos 1970: Nelson estava realizando O Amuleto de Ogum, que ele próprio estava fotografando – e, mesmo sem ter os recursos ideais para trabalhar, Hélio aceitou participar do filme por um curto período. Nelson diz: “Hélio me deu uma semana de trabalho”. A versão de Hélio era mais divertida: Nelson teria lhe chamado para visitar o set, como quem não quer nada... Ao ver o amigo acertando a luz com tão poucos spots, Hélio teria dado alguma sugestões e assim acabou topando ficar por alguns dias na produção do filme protagonizado por Ney Sant’anna, Anecy Rocha e Jards Macalé. Nos anos seguintes, Hélio voltaria a fazer um novo longa com Nelson, Tenda dos Milagres (de 1978), e um média baseado em Machado de Assis, Missa do Galo (1982). Novamente, ambos foram feitos com recursos mínimos – e Hélio costumava se lembrar de que, enquanto eles filmavam em Salvador Tenda dos Milagres novamente com pouquíssimos spots de luz, a poucos quarteirões de distância era feita a produção de Dona Flor e seus Dois Maridos com quilos e mais quilos de equipamentos de luz.

Em 1980, Hélio Silva chegou a dirigir três documentários em curta-metragem: Artesanato Tiradentes, Igreja de São Francisco e Alguns Santeiros de Minas. Eram filmes cuja produção e difusão se beneficiava do cumprimento da chamada Lei do Curta (que, ainda em vigor, não é mais respeitada). Do mesmo modo, nesse período Hélio também fotografou outros curtas produzidos por Braz Chediak.

Nos anos seguintes, no início da década de 1980, toda a produção de cinema no Brasil começava a entrar num processo de lenta agonia, que se intensificaria com o fim da Embrafilme e perduraria até meados dos anos 90. Nesse período, Hélio tornou-se professor da Escola de San Antonio de Los Baños, em Cuba. Nos anos 1990, Hélio fotografou o primeiro filme de longa-metragem do experiente diretor de televisão Walter Avancini, uma segunda versão para Boca de Ouro, a partir da peça de Nelson Rodrigues. Além disso, fotografou também um filme que se passa numa comunidade de ciganos: Manôushe (1992), hoje inacessível no Brasil. E também estabeleceu uma nova parceria, a última em sua carreira, com o cineasta Otávio Bezerra, com quem realizou os filmes A Dívida da Vida (1992) e O Lado Certo da Vida Errada (1996), além de ter registrado parte das imagens de Atabaque Nzinga, finalizado após o falecimento de Hélio Silva.

Nos últimos anos de vida, os problemas de saúde por que Hélio passou expuseram o drama de centenas de técnicos e artistas que trabalharam em filmes no Brasil. Sendo profissionais contratados a cada projeto, essas pessoas não têm carteira assinada e portanto não têm acesso à seguridade social. Hélio teve um forte apoio de amigos próximos como o montador Severino Dadá e o fotógrafo Leonardo Bartucci - e sua situação gerou um movimento de solidariedade da classe cinematográfica, capitaneado pela Associação Brasileira de Cinematografia, que reúne os profissionais da fotografia para cinema. Falecido em junho de 2004, Hélio Silva já era plenamente reconhecido então como um dos mais influentes e talentosos profissionais da história da produção de filmes no Brasil.


Texto publicado em julho de 2009 no catálogo da mostra Homenagem a Hélio Silva, realizada no CCBB.